1 de outubro de 2015

Não nos ponhamos a pau, não...

 
E, já agora, vale a pena ler este excerto da crónica de Nicolau Santos publicada no Expresso no dia 28.09. Porque, de facto, só quem não conhecer o país pode acreditar nas palavras de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas. Ou então já se esqueceu dos últimos quatro anos.


Por cá, alguém que não conhecesse o país suporia que foi o PS que esteve no Governo nos últimos quatro anos. Da direita à esquerda só se discute o PS, o programa do PS, as promessas do PS, os cortes na segurança social do PS, o acordo da troika que o PS assinou, o plano secreto que o PS tem para se aliar à CDU e ao BE para não deixar o centro-direita governar. A coligação Portugal à Frente acusa o PS de criar instabilidade e insegurança, a CDU e o BE acusam o PS de subscrever as políticas da direita.

E ninguém debate os últimos quatro anos, os 485 mil emigrantes que vão de engenheiros, economistas e médicos a investigadores, enfermeiros e bombeiros, os cortes nos salários da Função Pública e nas pensões dos reformados, a desmotivação completa dos funcionários públicos, o desemprego, o emprego que está a ser criado (90% é precário), os 50% de portugueses que ganham menos de 8000 euros por ano, o facto de estarmos a trabalhar mais 200 horas por ano e a ganhar em média menos 300 euros, o descalabro na educação (com o silêncio ensurdecedor de Mário Nogueira e da FESAP, ao contrário do que aconteceu quando Maria de Lurdes Rodrigues era ministra da Educação), a miséria que se vive no Serviço Nacional de Saúde (onde muitos profissionais são obrigados a comprar luvas ou a fazer garrotes com material improvisado), os medicamentos que faltam nas farmácias e só estão disponíveis daí a dois dias, a machadada que levou a ciência e investigação, os problemas que se continuam a verificar na justiça, a inexistência de respostas ao envelhecimento da população (em 2014 já havia mais de 4000 pessoas acima dos 100 anos em Portugal e há 595 mil portugueses com mais de 80 anos), a irrelevância do ministro dos Negócios Estrangeiros, a fragilidade da ministra da Administração Interna, as múltiplas garantias de Passos Coelho que foram sempre desmentidas por decisões do próprio Passos Coelho, o programa da coligação que não se discute porque não existe, etc, etc.

Ora, é tudo passado. Como disse Passos Coelho, «felizmente conseguimos ultrapassar a situação de emergência financeira que trouxe uma crise que nós resolvemos. Fizemos muito para poder chegar a este momento e os sacrifícios que fizemos valeram a pena. Já não temos necessidade de vos pedir um contributo adicional. Já não temos nenhuma medida restritiva nas pensões». Pronto, a crise está resolvida e agora é sempre a alargar o cinto.

Por isso, o líder da coligação Portugal à Frente pede agora aos eleitores «uma maioria boa, uma maioria grande» e diz que «quando temos necessidade de qualificar maiorias, alguma coisa esta errada. Estou a referir-me a um governo estável que tenha apoio no Parlamento para evitar que daqui a nove meses tenha de haver eleições», disse, esclarecendo porque não pede uma maioria absoluta. «O que nós queremos não é o absoluto, é estabilidade para governar».

Além disso, «nestes quatro anos tentei sempre um espaço de compromisso, de diálogo, com a oposição». Mas infelizmente «é a oposição a dizer que não dará condições para o país ser governado» e «os portugueses têm de julgar isso». Em qualquer caso, avisa: «Andamos com a alma cheia mas não andamos com o rei na barriga. Nós sabemos que as eleições se ganham a 4 de outubro».

Mas o certo é que na tracking pool diária do Público a coligação vai com 5,1 pontos à frente do PS, embora o número de indecisos tenha aumentado. E a coligação vira agora o discurso para tentar recuperar os 600 mil votos de eleitores que perdeu desde que em 2011 chegou aos 2,8 milhões de votantes. Para já, os resultados são estes: 38% PàF; 33% PS; 9% CDU: 6,7% BE; indecisos 25%.

Também o inquérito diário da Aximage para o Jornal de Negócios mostra que a vantagem da coligação face ao Partido Socialista atingiu, este domingo, o valor mais elevado. 5,6 pontos separam, agora, as duas forças políticas: 37,9% contra 32,3%. Jorge de Sá, responsável da Aximage, é taxativo: a probabilidade de coligação ter mais votos que PS pode ser «estimada em mais de 60%». Para o Correio da Manhã, a coligação segue à frente com 37,9% e o PS tem 32,3%.

Perante isto o que faz e diz António Costa? Pois o líder do PS recebeu ontem uma injeção de ânimo de Freitas de Amaral, que em Braga lhe disse: «Vai ganhar! Não acredite nas sondagens! O António Costa vai ganhar!». O certo é que Costa foi levado em ombros em Guimarães e em Barcelos, onde a cada passo um abraço, pediu a concentração de votos em torno do PS para obter uma maioria que lhe permita governar. Numa sessão em que João Cravinho se sentiu mal quando estava a discursar, Francisco Assis juntou-se a Costa no apelo ao voto útil.

O líder do PS, que ouviu jovens emigrantes através do Skype – e todos lhe disseram que não vêem condições para voltar tão cedo – advertiu que o atual Governo pretende prosseguir «um programa impiedoso» nos próximos quatro anos. «Ao longo destes quatro anos, a coligação mostrou ser radical. Colocou os portugueses uns contra os outros. Nós queremos a estabilidade das famílias, das pessoas, das empresas, do quadro fiscal. Para isso, é necessária uma mudança com confiança», defendeu.

6 comentários:

CAP CRÉUS disse...

sabes também o que me faz espécie?
Onde andam os professores, os pensionistas, os reformados e os restantes FP e os pais de quem teve de emigrar e os próprios emigrantes?

Já viste se todos estes votassem noutros que não os que lá estão??
Incrível como depois de sermos espoliados, esta corja de bandidos ainda tem hipóteses.
Mete-me nojo, sabes?

Vespinha disse...

Sim, não consigo perceber... Tanta gente prejudicada, com a vida quase destruída, e os números que saem todos os dias parecem confirmar que este governo vai ser validado. Não consigo perceber mesmo, faz-me muita confusão.

E pensar que no governo anterior 100 mil professores se manifestaram na rua por causa da avaliação de que iriam ser alvo. E agora, com tanto prejuízo que entretanto sofreram?

Sérgio disse...

Os professores é um exemplo fixe:
No governo do PS juraram todos a pés juntos que nunca mais voltariam a votar PS, e que a partir daí iriam votar em massa no governo dos salvadores: o PSD
Agora espera-se que, após um governo do PSD jurem todos a pés juntos que nunca mais voltem a votar PSD, e que a partir de agora votem em massa no governo dos salvadores: o PS

Não é para ser mau, mas dá vontade de parafrasear um dos maiores filosofos da nossa praça: "aguenta! aguenta!"

Parece-me óbvo que a coligação vai ganhar. Historicamente os indecisos tendem a votar na continuidade (é assim em todos os países), pelo que o PS para ter hipoteses de ganhar devia estar com uns 5% de vantagem para compensar este efeito. Atualmente existe uma ideia geral de que a coligação vai ganhar o que provavelmente ainda vai acentuar este efeito, até porque não é óbvio que o PS venha a ter politicas assim tão diferentes e portanto entra-se na lógica do "pior que está não fica, portanto o melhor é não nos metermos em aventuras". Depois há ainda o efeito de que é pior não ter governo a ter o governo da coligação, o que vai atrair ainda mais indecisos para votar na coligação. Moral da história: aposto na vitória da coligação com maioria absoluta. Moral da história 2: "aguenta aguenta!"

Vespinha disse...

Exatamente, «Aguenta, agenta!». O pior é quem não vota na coligação e tem de apanhar com o que decide a carneirada... Este país está desgraçado. Acho que até me vou rir quando depois vir mais medidas de austeridade!

Sérgio disse...

Ó Vespa, também não vejo que o PS tenha uma varinha mágica para resolver os problemas. Aqui parece-me que há dois grandes caminhos: continuar ou sair do euro. PS, PSD, CDS, estão dentro da primeira opção pelo que as politicas nas grandes decisões acabam por cair no mesmo.
Pode soar um pouco sinistro, mas tive pena que tivesse havido acordo com a Grécia, porque caso não tivesse havido teriamos uma "cobaia" para ver o real efeito de uma saída de um país do euro. Como houve acordo, que não é mais do que um empurrar o problema uns anos mais para a frente, continuamos no ciclo do "não existe alternativa".

Vespinha disse...

Também tinha essa curiosidade, saber o que poderia ter acontecido na Grécia...