20 de dezembro de 2018

O diário do meu pai, de Jiro Taniguchi

Que maravilha este livro! Yoichi regressa à sua terra natal mais de dez anos depois de a ter deixado, para o funeral do pai. Em criança tinha sido ali muito feliz, mas depois do divórcio e consequente partida da mãe, passou a ser uma criança e um adolescente taciturno, ansioso por deixar tudo para trás.

Na noite em que vela o pai, em conversas com familiares, amigos e conhecidos, fica a compreender a aparente austeridade e sisudez do pai, e simultaneamente o amor que este lhe tinha. Um amor transmitido de modo muito próprio que nunca foi correspondido e que só agora, depois da morte, é descoberto.

Os desenhos são de uma grande simplicidade, todo o desenho muito limpo, mas tudo carregadíssimo de emoções. Uma excelente novela gráfica e uma grande lição de vida.

19 de dezembro de 2018

Às vezes sou prendada

Por exemplo, quando tenho de tricotar cachecóis para a Luísa e a Maria se vestirem de renas na festa de Natal da escola.


17 de dezembro de 2018

O fim de uma geração

Já não tenho nenhum dos meus quatro avós há muitos, muitos anos, mas a geração deles na minha família só terminou hoje de manhã, quando perdi o meu último tio-avô aos 98 anos.

O Tio Quim era alentejano de Elvas, tinha sido professor de Geografia em Lisboa e até aos 90 anos foi uma pessoa extremamente ativa. Era calmo, adorava contar anedotas, e fazia o melhor gaspacho e a melhor salada de frutas que comi na minha vida (de que no Natal sempre se orgulhava imenso ao perguntar-me se estava boa). Tinha sempre nozes em casa, que surripiava quando ia às Amoreiras através de uma técnica que me ensinou.

Na sua quinta de Elvas passei alguns dos melhores momentos dos verões da minha adolescência, mimada pela Nanã, irmã da minha avó, mas sobretudo pelo Tio Quim, com quem ia com frequência «à cidade» e que à tarde me preparava parrameiros e sumo de laranjas das árvores da quinta colhidas e espremidas por ele, enquanto eu lia os meus livros.

Que bons tempos foram esses, Tio Quim. Até um dia.

Cuidado com o «sleep texting»

Se usam muito o telemóvel à noite, sobretudo na cama antes de adormecer, e se dormem com ele ao lado, cuidado com a possibilidade de enviarem uma mensagem enquanto dormem. Num inquérito feito nos Estados Unidos a 376 universitários, 26% por cento admitiram já o terem feito sem dar por isso.

É que além de revelar perturbações do sono, uma mensagem destas pode revelar outras coisas...

7 de dezembro de 2018

Smoke gets in your eyes, de Caitlin Doughty

Aos 20 e poucos anos, Caitlin decidiu seguir uma carreira que lhe permitiria compreender melhor algo que a perseguia desde a infância, quando vira uma criança a cair e a morrer num centro comercial: a morte e a nossa relação com os mortos. Tornou-se funcionária numa casa mortuária, mais em concreto responsável pelo crematório (nos EUA estes funcionam nas «funeral homes» e não nos cemitérios).

Sempre com respeito pelos mortos, faz descrições desassombradas dos corpos e de toda a panóplia de intervenções a que são sujeitos, desde a morte ao enterro ou cremação, passando pelo embalsamamento ou embelezamento, muito popular nos EUA. Mas fá-lo muitas vezes num tom crítico, dando por si a defender um destino do corpo o mais natural possível. E a decidir que, quando chegar a sua hora, quererá um funeral «verde» ou «natural», algo infelizmente ainda não praticado em Portugal mas que seria também o que quereria para mim.

Gostei muito deste livro.

5 de dezembro de 2018

Nem tudo é fácil

Esta fase entre os 2 e os 3 anos é muito engraçada, é quando as miúdas começam a interagir connosco a sério, a dizer as primeiras palavras e a formar as primeiras frases, a fazer gracinhas. Mas é também a fase das brirras, e têm sido mais do que muitas.

- A Luísa está a comer bolo. Diz que não quer mais. Mas afinal já quer. Depois já não quer e cospe um bocado. Tiro-lhe o prato da frente e começa uma birra descomunal, em que tenta bater e morder enquanto eu lhe tento vestir a bata e o casaco para sairmos. Acho que tenho mais facilidade em dominar um gato assanhado.

- A Maria está na sanita. Diz que não quer fazer chichi. Tiro-a e levo-a para o quarto. Quando já está no trocador a pôr a fralda diz que afinal quer. Levo-a de volta para a sanita. Mas já não quer. Regressamos ao quarto. E quer outra vez. Ponho-lhe a fralda tentando escapar à chuva de pontapés que vem da minha frente.

- A Luísa quer um livro que a irmã tem na mão. Tenta tirar-lho à força e magoa-a. Digo-lhe para pedir desculpa. Ela bate-me e vai de imediato para o castigo, onde durante 5 minutos grita, esperneia e tenta morder o chão.

- A Maria bate na irmã e vai para o castigo. Senta-se lá feliz e contente como se nada fosse, inclusive a cantar.

Há muitos dias assim.

4 de dezembro de 2018

O coração é o último a morrer, de Margaret Atwood

Vive-se num mundo à frente do nosso tempo, em que a crise económica e social assola todo o planeta e em que quase todos se veem desprovidos dos bens essenciais. Assim vivem Charmaine e Stan, num velho carro a cair aos bocados, sobrevivendo de pequenos trabalhos que mal lhes chegam para comer.

Até que um dia Charmaine vê um anúncio a uma experiência social que promete resolver todos os problemas da sociedade. Em Consiliência todos têm uma casa e um emprego, tudo é sereno e bem organizado. No Positrão, todos estão presos mas têm missões importantes a cumprir. E uma coisa alterna com a outra: um mês em Consiliência, um mês no Positrão, alternando com outro casal que lhes ocupará a casa ou o lugar na prisão. Há que chegue para todos, mas não se pode sair da linha.

Só que Charmaine e Stan acabam por não cumprir as regras, desenvolvendo obsessões pelos seus alternantes, o casal que ocupa a casa ou o seu lugar na prisão quando eles não estão. A fuga à «normalidade» não escapa à organização, e a distopia aprofunda-se, naquela que é já uma imagem de marca dos romances de Atwood.