Ouvi pela primeira vez Alain de Botton numa
TED Talk, onde, em cerca de 20 minutos, falou de sucesso e de falhanço profissional, e de como isso acaba por nos definir unilateralmente perante a sociedade, e não devia. Depois pesquisei um pouco e descobri que Alain de Botton é um filósofo dos tempos modernos, alguém que fala a nossa linguagem e que nos consegue atingir, sempre na perspetiva de ajudar cada um a ser mais feliz.
Por isso não hesitei em comprar este pequeno livrinho, escrito durante uma semana quando de Botton se tornou no primeiro escritor residente num aeroporto. Durante sete dias em Heathrow, observou a tristeza das partidas e a por vezes alegria das chegadas, vagueou pelo
backstage dos bagageiros, do pessoal do
catering, dos responsáveis pela segurança, conversou com dezenas de pessoas e, acima de tudo, refletiu em como um aeroporto pode ser um microcosmos que representa a sociedade maior.
A propósito de tudo e de nada, de Botton escreveu algumas passagens que quero partilhar, não por serem teorias altamente elevadas, antes por representarem coisas tão simples com que me identifico mas que, por não me chamar Alain de Botton, nunca tinha verbalizado:
- sobre uma vez na vida podermos correr riscos que nesse momento não são riscos: «... neste momento a calma reina no pedaço de pista que, só por si, é responsável pelo fim da paz e do sossego de dez milhões de pessoas. Podemos atravessá-lo sem pressa e até podemos ceder à tentação de nos sentarmos de pernas cruzadas no seu centro, um gesto que partilha algo da sensação sublime de se tocar num cabo de alta tensão desligado, passar os dedos ao longos dos dentes de um tubarão anestesiado ou de nos lavarmos na casa de banho de mármore de um ditador deposto.»
- sobre o medo de termos culpa ainda que saibamos que não a temos: «Uma longa espera na fila do detetor de metais pode induzir em muitos de nós a começar a interrogarmo-nos se afinal não teremos saído de casa com um explosivo escondido na mala ou se não nos teremos submetido involuntariamente a um curso de vários vezes de formação de terroristas. (...) O sentimento de culpa por vezes torna-se tão forte na idade adulta, que pode compelir uma pessoa a prestar declarações falsas às autoridades, ou mesmo a cometer crimes reais, como meio de conseguir algum alívio da sensação extremamente opressiva de já ter feito algo errado.»
- sobre a sensação de estranheza no regresso a casa depois de uma viagem: «O nosso país, de repente, parece-nos o mais estranho dos destinos, com cada pormenor a ser relativizado pelas outras terras que visitámos. Que peculiar nos parece a luz matinal, quando comparada com a memória da madrugada nos montes Obudu; que invulgar é o som dos anúncios gravados, depois do vento nas montanhas do Atlas; e quão inexplicavelmente inglês é o tagarelar de duas mulheres do pessoa de terra, quando ainda temos nos ouvidos o estridor de um mercado de rua em Lusaca! Desejamos nunca perder esta perspetiva. Queremos continuar a contrapor a pátria ao que conhecemos doutras realidades alternativas, como as que existem em Tunes ou em Hyderabad. Queremos nunca esquecer que nada aqui é normal, que as ruas são diferentes em Wiesbaden e Luoyang, que isto aqui é apenas um de muitos mundos possíveis.»