4 de fevereiro de 2016

Eu nas urgências

Há cerca de duas semanas, tive de ir às urgências duas vezes com três dias de intervalo, para resolver o mesmo problema que depois se concluiu ser outra coisa. Da primeira vez, fui a São José. Da segunda, a Santa Maria.

Em São José: dei entrada a uma 3.ª feira pelas 5h da manhã, com dores terríveis do lado esquerdo do tronco, na zona da cintura. Passar da receção foi um pesadelo, agravado pelos vómitos com que comecei. Finalmente passei à triagem e logo de seguida para um médico que mal olhou para mim mas que pediu análises e uma ecografia renal. Apareceu então uma enfermeira, que me tirou sangue, colocou um cateter e me pediu para fazer recolha de urina. Quatro horas mais tarde mandaram-me embora, com medicação mas sem conclusões, uma vez que todos os exames não tinham detetado nada. Isto depois de uma outra médica me ter tratado com sobranceria, antes de voltar a ser atendida pelo médico inicial. Mais de uma semana depois continuava com uma enorme nódoa negra na mão direita, fruto da colheita de sangue.

Em Santa Maria: dei entrada no sábado seguinte pelas 18h, com os mesmos sintomas mas sem vómitos, depois de ter passado o dia a tentar combater a dor com a medicação que já tinha em casa. Uma enfermeira atendeu-me na triagem e chamou uma médica que apareceu um bom bocado depois. Esta olhou para mim, fez-me perguntas, fez-me a manobra de Murphy (duas pancadas nas costas para avaliar a hipótese de uma cólica renal) e pediu análises ao sangue, urina e colheita de urina para urocultura. E outra ecografia renal. Tiraram-me sangue com cuidado e deram-me todas as instruções para recolher urina assética. Outro médico fez-me a ecografia, demorando no mínimo o dobro do outro, acompanhando cuidadosamente todo o percurso do sistema urinário. Mais tarde, enquanto as análises não ficavam prontas, a enfermeira inicial colocou-se um cateter, para administração de medicação endovenosa. Nada de nódoas negras, amarelas, verdes, nada. Voltei a ser vista pela médica, sem conclusões porque tudo se encontrava normal. Até que outro médico (por sinal o meu pai, que tinha ido comigo!) observou a forma como eu me sentava para aliviar um pouco a dor e fez uma apalpação pormenorizada às minhas costas. Entre ele e a médica, chegaram a uma conclusão: dor muscular, disfarçada pela zona em que apareceu e pelos vómitos, que indiciavam uma cólica renal. Três dias depois saiu o resultado da urocultura: negativo. Tratamento: um anti-inflamatório ligeiro e mais cuidado com a postura no sofá.

Conclusões:
1. O atendimento em Santa Maria não teve nada a ver com o de São José. Mais humano, mais cuidadoso, mais ágil. Mesmo sem chegarem a um diagnóstico imediato, tentaram fazê-lo e com interesse.
2. Médico que não olha para o paciente não é médico, mas um funcionário administrativo a inserir dados num computador. É preciso olhar para o doente, mexer-lhe, fazer perguntas. Às vezes basta isto para fazer um diagnóstico.

7 comentários:

ana chagas disse...


Espero que já estejas totalmente recuperada.

Para mim, este é um dos temas mais tristes da actualidade: o do estado da Saúde em Portugal.
Ficar doente é assustador, não só pela maleita em si, mas pela lotaria que se tornou ir a um qualquer hospital ou centro de saúde. Ninguém sabe de antemão como vai ser atendido, em quanto tempo, e mais grave que tudo, se o será de forma profissional, humana e capaz, sem erros de diagnóstico e tratamento, às vezes com consequências horríveis.
Sou defensora do SNS, mas de um que tem que ser melhorado em todos o níveis pelo bem tanto de utentes como dos profissionais, porque a saúde deve ser, se não gratuita, disponível para todos.
Mas a verdade é que ainda ontem fui a uma consulta no privado, e deixa-me dizer como é refrescante haver quem nos atenda o telefone em segundos, e esperar só 10 minutos para além da hora marcada.

CAP CRÉUS disse...

Estás melhor?
Sim, é uma lotaria nos dias que correm.

Paula Ferrinho disse...

Gosto muito do teu blog, que "conheci" há pouco tempo.
De facto, este teu post fez-me lembrar uma consulta que tive há pouco tempo, com uma nova médica de família que nos foi atribuída. Lá fui eu com os meus filhos e acreditas que, nem por um segundo, a médica olhou para mim, ou me fez qualquer pergunta? Supostamente, essa primeira consulta seria para nos conhecer a todos! Eu tinha levado os boletins de saúde dos miúdos e ela levou o tempo todo a inserir dados no computador, daquilo que eu, ao longo dos anos, anotara no livrinho. Enfim! Fiquei super mal impressionada e agora, graças a Deus, já temos outro médico de família, que é o oposto. As tuas últimas frases, "um médico tem que olhar para o doente, senão, não passa de um funcionário administrativo", fez-me lembrar este episódio e percebo perfeitamente o que te aconteceu!
Um beijinho e já agora, adoro o teu blog!!

Pink Poison disse...

Eu em Loures, no Beatriz Ângelo, sou muito bem tratada. Espero que estejas bem.

Vespinha disse...

Eu estou totalmente bem, isto foi há duas semanas e só escrevi agora porque queria ganhar algum distanciamento. :)

Como os meus pais são médicos, falamos de muitas coisas a nível de saúde, e sei de muitas histórias do meu pai em que fez o diagnóstico apenas por observar a forma como o paciente caminhava ao entrar na consulta. Ou através de uma conversa que aparentemente não teria nada a ver com as queixas. Por isso, fico doida quando sou atendida (e não vista, sublinhe-se) por quem só olha para o ecrã do computador.

E acho que em grande parte das vezes isto não tem a ver com irmos a um hospital público ou privado, é uma questão de atitude e de como se olha para a medicina como uma missão e não como um simples emprego.

Pink Poison disse...

É como os professores: uns ligam muito aos pais preocupados com questões que viram ao longo do dia, outros querem é crianças "standart" e despejar matéria. Como ando sempre com a cabeça feita em água e às 22h estou ao telefone com pais, adivinha quem merece cada tostão que recebe?

Anónimo disse...

Duas vezes à urgência de um, dois!, hospitais, por causa de dores musculares e, ainda por cima, com um pai médico? Haja paciência! Por estas e por outras que as coisas estão como estão!