Gosto de casas, sobretudo de apartamentos. Isto é, de as conhecer. Não que seja daquelas pessoas que aos fins-de-semana vai ver casas só porque sim. Aliás, a última vez que fiz isso acabei com uma casa comprada. Mas gosto de conhecer casas de pessoas, mobiladas e já com alma.
Tantas e tantas vezes, vou na rua, olho para uma janela e quase tenho vontade de tocar à campainha para lá ir espreitar. Então quando ando em viagem a vontade é ainda maior. Porque adorava ter entrado em dezenas de apartamentos em Berlim, em Barcelona, em Moscovo, em Veneza. Na impossibilidade de lá entrar, folheio revistas de decoração e de arquitectura, e tenho uma série de livros só sobre apartamentos.
E, hoje de manhã, fui ao CCB ver uma exposição sobre Le Corbusier (1887-1965), por muitos considerado o maior arquitecto do século XX. Não sei se terá sido o maior, mas pelo menos um dos mais versáteis foi de certeza. Dele, vi pintura, escultura, mobiliário, papel de parede, capas de livros e de revistas, igrejas, pavilhões, sedes de instituições, casas e, claro, prédios de apartamentos.
Os que mais me impressionaram, pelo carácter funcional, foram as diversas
unités d’habitation que projectou para Marselha (a mais conhecida), Rezé-Nantes, Berlim, Briey en Forêt e Firminy. As
unités d’habitation, construídas após a II Guerra Mundial, são também chamadas de
cités radieuses (por o conceito ser essencialmente o de concentrar uma pequena cidade em altura, com todos os serviços essenciais num mesmo bloco).
Para dar uma ideia, ao nível do rés-do-chão há apenas grandes pilares, para que a circulação se faça como se ali não houvesse qualquer edifício. A entrada para o bloco é feita pelos extremos. A cada x andares, há 1 ou 2 exclusivamente dedicados a comércio (mercearia, talho, cabeleireiro, padaria), acessíveis através de «ruas aéreas». No terraço, a cerca de 16 andares de altura, há uma piscina para crianças e um jardim infantil.
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E as casas? Ah, pois, as casas… Nada de fantástico a nível de dimensões, nada do que se vê hoje com salas de 30 e 40 m2. Mas tudo extremamente funcional, com um aproveitamento do espaço incrível e muito eficiente (concebido para corpos humanos com 1,83 m). Desenhados como «garrafas numa garrafeira», isto é, construídos ao comprido e abarcando o edifício nas suas duas frentes (o que facilita a ventilação), cada apartamento tem dois pisos com cerca de 24 m de comprimento por 4 m de largura. Fora dos apartamentos, corredores escuros para desincentivar a «conversa» (o que poderia incomodar com o barulho) e portas de entrada muito bem iluminadas. Lá dentro, cozinha americana com triturador de lixo no lava-louças, fogão eléctrico e conduta de lixo (atenção, estávamos nos anos 50!). Ainda no andar de baixo, sala com pé direito elevado junto à janela, que comunica com o andar de cima. Lá em cima, os quartos. O das crianças, dividido ao meio por uma porta deslizante que une ou divide as áreas. Aberta, proporciona um espaço comum. Fechado, tem uma ardósia para escrever na parede.
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Para quem quiser experimentar uma visita virtual, espreite
http://maisonradieuse.org/visiter/visiter.html. Para ver fotografias, aqui:
http://www.villes-en-france.org/histoire/Corbu13.html.
Vale bem a pena.